terça-feira, 21 de agosto de 2007

"Versão brasileira, Herbert Richers."


Herbert Richers é um personagem de cinema. Com uma diferença: ele fica do lado de cá das câmeras, já que grande parte da produção nacional realizada até hoje passou pelas suas mãos. São 50 anos, a metade da idade do cinema mundial, produzindo jornais, chanchadas, filmes, longas e curtas-metragens. Por isso, a história do cinema brasileiro poderia ser contada a partir da sua própria história. E nesse momento, quando comemoramos seu meio século de carreira, a Faculdade da Cidade lhe concede o título de professor Honoris Causa, uma homenagem prestada por faculdades a pessoas que deram sua contribuição para a cultura do país.
Paulista de Araraquara, Herbert Richers veio para o Rio de janeiro em 1942 para trabalhar no maior laboratório cinematográfico do país, que pertencia a um tio. A Herbert Richers S.A. foi fundada em 1950 e sua primeira produção foi um jornal cinematográfico que, em seis meses, conseguiu ser distribuído e exibido em mais de 2.000 cinemas, nas principais cidades do país.
Em vários momentos, Herbert Richers foi o precursor de novas tendências. Aconteceu assim com o Cinema Novo, quando este ainda estava a caminho. O filme "Os Cafajestes" trouxe inovação e mais sucesso. O dinheiro veio através de "Meu Pé de Laranja Lima"que, segundo o produtor, deu muito trabalho para realizar. Ele também foi responsável pelo surgimento de novos talentos, como e o caso de Vidas Secas , um longa produzido com Nelson Pereira dos Santos e que teve como diretor de fotografia Luiz Carlos Barreto - atualmente um dos mais conceituados produtores brasileiros.
A dublagem, como a conhecemos hoje em dia, foi introduzida pela Herbert Richers em 1960, com a ajuda de Walt Disney. Como a legenda na época não era boa, a televisão pequena, em preto e branco e sem definições, resolveram colocar vozes brasileiras nas produções estrangeiras. Hoje são dublados, em média 150 horas de filmes por mês, o que corresponde a setenta por cento da dublagem exibida nos cinemas. Ou seja, a marca registrada Herbert Richers não está presente apenas no que é feito no país, mas em grande parte do que recebemos de fora também.
Os estúdios Herbert Richers lançaram nomes que, mais tarde, se tornariam famosos, como Costinha, Fred e Carequinha, além de Ankito, Zé Trindade, Grande Otelo e Ronald Golias, presenças constantes nas produções da casa. O surgimento de grandes marcos do cinema nacional em substituição às produções mais descompromissadas realizadas até então também aconteceu dentro da Herbert Richers. De lá saíram filmes como "O Assalto ao Trem Pagador", "Vidas Secas", "Bonitinha, Mas Ordinária", "Pão de Açúcar", "Selva Trágica" (peça-chave do Cinema Novo) c "Asfalto Selvagem". As estrelas e astros que já faziam parte do imaginário coletivo foram trocados e em seu lugar entraram nomes como Jece Valadão, Reginaldo Farias, Rejane Medeiros, Átila lório, Maria Ribeiro e Eliezer Gomes. Assim como as assinaturas de Nelson Pereira dos Santos e Roberto Faria substituíram as de Victor Lima e J.B. Tanko.
J.B.Tanko é um capítulo à parte na história do cinema nacional. Ele foi o responsável pelos últimos filmes dos Trapalhões, mas ficou realmente conhecido pelas chanchadas dos anos 40 e 50. De "Sai de Baixo"a "Asfalto Selvagem", dirigiu na Herbert Richers atores como Dercy Gonçalves, Renata Fronzi e Jece Valadão em filmes produzidos, na maior parte das vezes, por Oswaldo Massaini e Arnaldo Zonarí.
As organizações artísticas Herbert Richers foram fundadas em 1956 para a exclusiva produção de cinejornais. Pouco tempo depois já aderia aos longas-metragens, na época um setor ainda visto com certo temor. Começou modestamente com a comédia "Sai de Baixo", mas se desenvolveu a ponto de chegar a produzir oito filmes por ano, a maior média de qualquer estúdio ou produtora daquela época. Com o desenvolvimento da televisão, Herbert Richers organizou um departamento de dublagem de filmes para TV, obtendo a representação exclusiva da MCA TV LTD., de Hollywood, proprietária dos estúdios da Universal. Daí para a produção dos primeiros filmes para -a TV no Brasil foi um pulo. O inevitável seria que a maior distribuidora de filmes para a televisão entrasse também para o mercado de vídeo, o que acabou acontecendo em 1988.
Pode-se contar uma história de duas maneiras: fictícia ou didaticamente. No caso desse recente período do cinema brasileiro, podemos ler a descrição anterior ou optar por um breve mergulho na filmografia produzida por Herbert Richers. Como filmes são criados com o propósito de nos arrebatar e envolver, nada melhor do que os utilizarmos para contar a sua própria história. Seguem-se, então, alguns marcos capazes de relatar o processo de desenvolvimento de parte de nossa produção.
"Sai de Baixo" liderou o frescor do todas as chanchadas que vieram a seguir, revelando personalidades como, além dos já citados Fred e Carequinha, Costinha, Anilza Leoni, Adalgisa Colombo, Adelaide Chiozzo, Ivon Curi, Norma Blum e, posterior mente, Ronald Golias e Renata Fronzi. Merece deslaque, por exemplo, "Metido a Bacana", que bateu recordes de bilheteria com Ankito vivendo um duplo papel, numa espécie de O Principe e o Mendigo à brasileira, filmes como "Com Água na Boca", 'Sherlock de Araque", "Massagista do Madame" e "Hoje o Galo Sou Eu" provaram que, já naquele tempo, cinema ora a maior diversão.
Pouco a pouco, a malícia descompromissada dessas produções começou a abrir espaço para obras realizadas dentro de grandes estúdios e repletas de um aparato técnico até en tão desconhecido. Significava uma quebra do estilo de produção naif que, algum tempo depois, tornou só ainda mais brusca com a chegada e o impacto do Cinema Novo. Esse gênero trouxe intrínseco a existência de um cinema pobre, mas que substituía a busca inocente do simples entretenimento, próprio das chanchadas, por uma temática voltada para as mazelas do Brasil. Foi o responsável por projetar a produção brasileira no âmbito internacional (objetivo primordial da extinta Vera Cruz), sem esquecer da meta de renovar o cinema nacional, desvencilhan-do-o do modelo norte-americano. Mais uma vez, Herbert Richers se sobressai com uma contribuição essencial à consolidação do novo gênero, expressa em filmes como "Boca de Ouro", "Bonitinha, Mas Ordinária" (da dramaturgia rodrigueana; ambos retratavam o corrompido contexto social da época); "Assalto ao Trem Paga-dor" (drama policial de Roberto Faria); "Selva Trágica" e "Vidas Secas". Estes dois últimos são exemplos perfeitos da importância da literatura como uma das maiores fontes de inspiração do cinema novo. Em "Selva Trágica", baseado no livro homônimo de Hernani Donato, é evidente a tentativa de captar, sem acréscimos ou subtrações, a realidade amarga e triste dos plantadores de erva-mate nos confins de Mato Grosso. Já em "Vidas Secas", Nelson Pereira dos Santos - que junto a cineastas como Glauber Rocha e Rui Guerra representava o movimento - captou a trágica sobrevida do sertão nordestino descrita por Graciliano Ramos. No entanto, enquanto os personagens ardiam sob o sol impiedoso, por pouco o filme não arde sob as chamas que quase levaram Herbert Richers à ruina.
Incêndio:
"Vidas Secas" só se salvou do incêndio que poderia ter posto fim a toda vida ativa da Herbert Richers porque estava no estúdio da Tijuca, junto a todos os outros longas-metragens, e não no edifício Astória onde se localizava a empresa. Um incidente nessas dimensões seria o fim prematuro de um produtor que, em 1942, chegou ao Rio de janeiro para trabalhar num laboratório cinematográfico. Ao mesmo tempo que buscava se tornar um cine-grafista, Herbert Richers trabalhava na cobertura jornalística dos filmes da Atlântida. Em 1950, fundou a própria empresa — Herbert Richers SA.—, que começou produzindo cine-jornais até se iniciar no ramo dos longas-metragens. Tempos depois, a amizade com Walt Disney proporcionou um investimento no setor de dublagens de filmes americanos a serem televisionados aqui.
Como se vê, é uma trajetória que o fogo não pode apagar.
Agora uma entrevista para o jornalista Hamilton Rosa Jr. da revista Ver Vídeo, em sua íntegra:
As lições de Herbert Richers:
Quem não sabe completar o slogan "Versão brasileira..." talvez não se interesse por essa entrevista. Agora, quem conhece, com certeza irá além, para saber mais detalhes sobre esse empresário do ramo de entretenimento, cuja trajetória se confunde com momentos importantes da história cultural do Brasil. Na trajetória do mercado audiovisual brasileiro, há um nome que merece mais de um capítulo. Ele é Herbert Richers, um homem que pode se orgulhar de dizer que foi pioneiro do cinema, da produção a da distribuição de filmes. Que praticamente criou um modo de dublar próprio para os seriados de TVs - quem não se lembra do famoso bordão ?Versão brasileira: Herbert Richers?? - e que experimentou até o mercado de vídeo, montando uma distribuidora. Para Richers, faltava apenas desbravar o mundo do DVD, experiência que ele tem agora, com o lançamento de 27 clássicos da chanchada, restaurados e remasterizados, a serem distribuídos pela Europa Filmes. O primeiro lote chega em outubro e traz É de Chuá, com Grande Otelo, Ankito e Costinha; Entrei de Gaiato, com Dercy Gonçalves e Zé Trindade; e Golias Contra o Homem das Bolinhas, que dispensa apresentação. Herbert Richers nos recebeu em seu estúdio da Tijuca, no Rio de Janeiro (RJ), para contar uma pouco da sua jornada. Como diz um personagem em Cidadão Kane, "não dá para resumir uma vida em minutos", mas Richers se esforçou bastante para nos passar uma idéia do que tem sido a sua. E ouvimos atentamente sua voz terna, cheia de lições a transmitir.
VV - Os filmes da Coleção Herbert Richers foram todos restaurados?
Herbert Richers - Sim. Eu e o Wilson Feitosa, da Europa Filmes, fechamos este primeiro lote apenas com os filmes que foram restaurados recentemente, como É de Chuá, Entrei de Gaiato, Meu Pé de Laranja Lima e outros 24 títulos. Já tinha vendido o pacote para a TV a cabo e ao perceber a procura do produto, falei com o Wilson, em Manaus (AM), no final do ano passado, e resolvemos apostar.
VV - O slogan televisivo "Versão brasileira: Herbert Richers" marcou uma geração e continua a manter a popularidade de seu estúdio no ramo da dublagem. A história do cinema e da televisão parece que se confundem com a sua trajetória. Quando você realmente começou?
Richers - Olha, em uma reunião do Sindicato da Indústria Cinematográfica recentemente, as pessoas brincavam comigo dizendo que eu era o empresário mais velho atuando no ramo. De fato, acho que sou o homem mais velho do cinema e também o que tem a carreira mais extensa (risos). Porque comecei no final dos anos 30, aos 17 anos, como fotógrafo e estou com 82 anos. Portanto, já tenho 67 anos de profissão e só pretendo parar daqui uns dez anos (risos).
VV - Você deve ter histórias ótimas para contar...
Richers - Ah, tenho muitas histórias, sim. Lembro-me de um episódio marcante, quando eu era fotógrafo, que me envolveu com o Assis Chateubriand. Era muito amigo do irmão dele, o Fred. Um dia, o Chateubriand ia partir para uma missão diplomática na Inglaterra e pediu para o Fred me convidar para ser o fotógrafo oficial desta missão. Fiquei envaidecido. Imagine, eles tinham os Diários Associados, tinham tantos fotógrafos excepcionais, e o Assis foi logo me chamar... Perguntei para o Fred por que o irmão dele me convidou e ele me disse: "Porque você é louro de olhos azuis!" Ele queria mostrar para os ingleses que no Brasil não tinha somente negros (risos).
VV - Você trabalhoo na Atlântida, não?
Richers - Minha escola começou na Atlântida, nos primórdios das chanchadas, na década de 40. Era muito ativo no estúdio, trabalhava como diretor de fotografia dos filmes do Jorge Ileli (N.R.: diretor do clássico policial Amei um Bicheiro) e também era o editor e o câmera do Jornal da Atlântida. Quando completei 28 anos, achei que estava ficando muito velho e que devia montar meu próprio negócio. Falei com o Luiz Severiano Ribeiro Jr. (o pai do atual presidente do Grupo de Cinemas Severiano Ribeiro), que era sócio majoritário da Atlântida, sobre minha intenção de abandonar o emprego e ele me falou que eu ganhava um salário muito bom e que seria louco de abandonar isso por algo incerto. Realmente ganhava muito bem, mas queria modificar o estilo do jornal cinematográfico. Fiz um contato com a Metro, que não estava satisfeita com o jornal de notícias que eles exibiam, e me propus a criar um novo noticiário. O problema que eles tinham é que havia poucas cópias do jornal e exibiam o noticiário cada semana em um cinema. Quando chegava no subúrbio, estava com mais de seis meses de idade e nada mais daquilo interessava. Então, idealizei um jornal com um número muito maior de cópias e criei um esquema de distribuição no Brasil inteiro, para que eles fossem exibidos pelo menos nas principais capitais do País.
VV - Mas como você conseguiu montar essa estrutura. Fez empréstimos?
Richers - Não, comecei montando pequenas estruturas, que foram crescendo e se desenvolvendo até chegar um ponto em que o meu jornal, que se chamava Jornal da Tela, atingiu 2.400 cinemas do país, o que era mais da metade do parque de exibição, que aquela altura contava com 4 mil cinemas. Enfim, virou uma distribuidora importante, que mais tarde foi vendida para a Embrafilme.
VV - Foi neste período que você começou a produzir filmes?
Richers - Foi. Uma vez que tinha distribuidora em todo lugar, comecei a estudar uma forma de me aventurar na produção de um longa-metragem. Quem me ajudou a concretizar esse sonho foi o J.B. Tanko, que mais tarde ficaria conhecido como diretor dos filmes dos Trapalhões. O J.B. Tanko tinha uma larga experiência com cinema, tinha dirigido filmes na Alemanha e também na Iugoslávia e estava no Brasil realizando filmes para um outro estúdio. Mas ele tinha dificuldades com o patrão porque não falava português direito. Não me lembro como o conheci, mas nos dávamos muito bem, principalmente fazendo comerciais para o cinema. Quando contei que estava planejando fazer um longa, o Tanko veio imediatamente para a Herbert Richers. Fizemos primeiro o Sai de Baixo, o filme que lançou os palhaços Carequinha e Fred. Como tínhamos o esquema de distribuição, conseguimos um sucesso muito maior do que esperávamos. Aí, logo em seguida fizemos o Com Água na Boca, novamente com a dupla, e, por feliz acaso, no filme seguinte, consegui trazer para o estúdio o Otelo.
VV - O Grande Otelo?
Richers - Sim. O Otelo teve um problema na Atlântida e não conseguia mais trabalhar lá. A verdade é que ele bebia muito e quando fazia isso se tornava um sujeito muito complicado. Quando a Atlântida desmanchou a dupla Grande Otelo e Oscarito, o Otelo, desesperado, me procurou para saber o que ele devia fazer. Eu tinha um argumento para começar a terceira comédia do estúdio, o Metido a Bacana, e pensei em criar uma dupla nova. Chamei o Ankito e ele e o Otelo se deram muito bem. Metido a Bacana estreou e foi um dos nossos maiores sucessos.
VV - Por que você não chamou o Oscarito?
Richers - Porque ninguém tirava o Oscarito de lá. Ele era a única grande atração que a Atlântida tinha naquela altura.
VV - O Golias também começou assim?
Richers - Começou, mas isso aconteceu mais tarde. Antes dele vieram o Ankito, o Costinha, que fomos nós que lançamos, o Jô Soares e, claro, o Renato Aragão.
VV - Como era o contrato com os atores?
Richers - Com o Ankito e o Grande Otelo, eu tinha um contrato anual. Com os outros, negociava por filme. Agora, outra coisa muito importante sobre aquela época era a nossa rapidez. Fazíamos um filme em 40 dias. E havia um período do ano, o Carnaval, em que as chanchadas faziam mais sucesso. Então, corríamos para lançar um musical duas semanas antes do Carnaval. Esperávamos as marchinhas carnavalescas saírem para incluir no filme, chamávamos todo mundo e em 40 dias estava na sala dos cinemas.
VV - Todo ano era assim?
Richers - Era. A Herbert Richers chegou a produzir até cinco filmes em um ano, mas havia sempre aquele musical que preparávamos para o Carnaval. Porque sabíamos que sempre seria nosso maior sucesso.
VV - E como você levantava o financiamento para produzir cinco filmes por ano?
Richers - Como fazia no começo, tirava do próprio bolso. Quer dizer, a esta altura já éramos uma indústria. Tínhamos um estúdio, uma equipe contratada, o esquema de distribuição... Bastava mantê-lo. E foi o que fizemos por quase 30 anos.
VV - 30 anos fazendo uma média de cinco filmes por ano? Por que você selecionou apenas 27 para lançar em DVD?
Richers - Porque só conseguimos restaurar estes. O processo de restauração leva tempo e é muito caro, custa cerca de R$ 30 mil para restaurar cada filme. Veremos o comportamento desta primeira leva e depois, se os filmes forem bem, continuaremos a restaurar os outros.
VV - Você já assistiu ao resultado?
Richers - Sim. Supervisionei todo o trabalho. O computador faz maravilhas. A grande vantagem é que é possível tirar os mínimos risquinhos na imagem. Também remasterizamos a trilha sonora, que estava em péssimo estado. O processo de restauração de cada filme levou cerca de 15 dias e o da trilha mais uma semana.
VV - A Herbert Richers produziu O Assalto ao Trem Pagador?
Richers - Produzimos O Assalto ao Trem Pagador, Vidas Secas e também distribuímos filmes de outros, como Os Cafajestes, do Rui Guerra, e Boca de Ouro, do Nelson Pereira. O Nelson está neste momento trabalhando com a gente. Ele está filmando aqui no estúdio seu novo filme, Brasília 18%.
VV - Você contou sua experiência no esquema de produção cinematográfica, mas como começou com dublagem?
Richers - Isso acabou acontecendo quase como uma conseqüência da produção dos filmes. Naquela época, quando fazíamos externas, não captávamos o som direto. Depois, levávamos o ator ao estúdio e dublávamos a cena. E a maioria dos filmes tinham cerca de 60% de cenas no exterior, portanto, desenvolvemos uma experiência muito grande de dublagem. E eu tinha conhecido um homem muito importante de Hollywood, que veio ao Brasil em 46 para filmar um documentário, chamado Walt Disney. Fui um dos câmeras da equipe neste documentário. Ficamos amigos e continuei mantendo contato com ele. Mais tarde, como tinha a distribuição no Brasil, quis representar a Disney no País. Mas ele tinha seu escritório de representação aqui e me propôs algo diferente. Ele estava começando a produzir para a televisão e me perguntou se eu não dublaria os seriados que ele estava fazendo, porque ele queria colocar os filmes dele na TV brasileira. Também, não tinha como exibir com legendas na TV, a imagem não era boa, as TVs eram pequenas, enfim, o Disney me deu uma série dele, chamada Zorro. Fiz a experiência e negociei a exibição do seriado na TV Tupi. Depois, ele me fez representante dos produtos Disney para a televisão. Foi curioso, porque naquela ocasião ninguém imaginava que a televisão se tornaria um fenômeno. Diante do sucesso, a Universal, a Warner e outrso, começaram a nos procurar e criamos o slogan "Versão brasileira, Herbert Richers", que se tornou a nossa marca e o nosso certificado de qualidade.
VV - A receita da dublagem superou rapidamente a da produção em cinema?
Richers - Não, não aconteceu assim. Continuamos realizando filmes de sucesso durante os anos 70 e foi nesta década que obtivemos nosso maior campeão de audiência, Meu Pé de Laranja Lima (1970). O cinema só deixou de ser um bom negócio para a Herbert Richers quando a inflação galopante tomou conta da economia. Trabalhávamos no esquema de auto-financiamento e, quando a inflação começou a dobrar de um mês para o outro, percebemos que não conseguiríamos recuperar a receita como fazíamos antes.
VV - Mas o estúdio ainda está em operação...
Richers - Me orgulho muito deste estúdio. Você sabia que ele é o mais velho em operação no Brasil? Este estúdio era da Carmem Santos. Ela era a maior estrela do cinema nos anos 30 e construiu este estúdio para rodar filmes com o Humberto Mauro. Quando a Herbert Richers começou, ele não era meu. Eu o alugava para rodar nossas chanchadas. Como era velho, tivemos que modernizá-lo, criar uma acústica para ele. Depois, nos anos 60, com a morte da Carmem, os filhos queriam se desfazer do estúdio e o puseram a venda. Eu o comprei.
VV - Como você o manteve no período da crise econômica?
Richers - Eu o aluguei para a televisão. Em 1976, houve um incêndio na Globo que destruiu os cenários da sua novela, O Casarão. O Boni, que era o diretor da emissora na época, perguntou se não podia transferir a gravação da novela para cá. Eles entraram aqui e acabaram sendo meus inquilinos por mais de 20 anos. Só saíram depois que o Projac (N.R.: o imenso estúdio que as Organizações Globo construíram em Jacarepaguá) foi inaugurado. Hoje, continuamos alugando-o para o cinema e para a publicidade. Na verdade, são dois estúdios. Um, com 200 metros quadrados e outro, com 700 metros quadrados. O Nelson Pereira está rodando o filme dele no maior.
VV - E as cabines de dublagem?
Richers - Temos hoje dez estúdios de dublagem, todos modernizados e que podem fazer inclusive gravação em dolby 5.1.
VV - Quanto tempo leva uma dublagem?
Richers - Depende do programa. Um longa-metragem de cinema demora mais, costuma levar uma semana. Estamos dublando uma novela mexicana para o SBT onde cada capítulo leva até dois dias.
VV - O que é uma boa dublagem?
Richers - É uma boa interpretação com uma boa sincronização. A boa dublagem é aquela em que o espectador acredita que o filme é falado em português.
VV - O que é mais difícil, ser um bom dublador ou um bom ator?
Richers - Geralmente um bom ator vira um bom dublador. O bom dublador tem que saber interpretar um papel, fazer as inflexões que o papel exige, mas tem que saber sincronizar o início e o fim da fala com a língua que ele está dublando.
VV - Qual é a língua mais difícil de dublar?
Richers - O japonês é complicado, o trabalho labial da língua é muito diferente. O indiano e o sueco também. Agora, quando é uma língua latina, como o italiano ou o francês, é mais fácil porque elas têm similaridade. Já o inglês, por exemplo, é mais curto. Eles resolvem a fala com uma frase de quatro palavras, enquanto que para dizer a mesma coisa em português são precisas seis. Por isso temos que buscar uma síntese.
VV - Os prazos são apertados?
Richers - São. O estúdio trabalha 24 horas. Dividimos as equipes em quatro turnos de seis horas cada.VV - O movimento continua alto então?Richers - Sim e acho que aumentará cada vez mais com o DVD. Antes, as distribuidoras dublavam apenas alguns filmes em DVD, principalmente os infantis. Agora, começam a fazer pesquisas e finalmente descobriram que a aceitação do filme dublado é muito grande. Na verdade, a dublagem aumenta a aceitação do produto. Claro, estou falando de um produto bem dublado. Veja o que acontece com a novela do SBT. O Sílvio Santos nunca ligou muito para a qualidade da dublagem. E as novelas eram horríveis, não havia sincronia na dublagem. Mostrei para ele que dava para criar essa sincronia, fazer com que os atores mexicanos falassem tão naturalmente em português, que o telespectador ficaria em dúvida se o produto era nacional ou estrangeiro.
VV - Nesta novela aparece o slogan "Versão brasileira, Herbert Richers"?
Richers - Não aparece porque o Sílvio quer que o público acredite que ela é nacional. Atualmente, esta novela mexicana está com os índices de audiência maior do que o das novelas brasileiras que ele está fazendo.
VV - Para obter uma perfeição técnica, imagino que você deve ter gastado muito dinheiro com profissionais qualificados, não?
Richers - Que nada. Aprendemos fazendo juntos. A mão de obra foi sendo aperfeiçoada aos poucos. Agora, a coisa amadureceu tanto, que das 50 casas de dublagem que existem no Brasil hoje, 40 trabalham com ex-funcionários formados aqui.
VV - Você fica bravo quando vê os funcionários que formou saindo daqui?
Richers - Ao contrário. Acho importante o crescimento deles, porque com isso tornamos a dublagem uma função para ser exercida por profissionais. Claro, existem pessoas que saíram daqui da maneira errada. Que quiseram sair daqui e roubar nossos clientes de forma desleal. Mas acho que faz parte do negócio. Afinal, comecei trabalhando com o Luiz Severiano e depois sai de lá para me tornar o maior concorrente dele. A concorrência faz você se corrigir, melhora seu trabalho.
VV - Esse seu tom enfático sugere uma personalidade forte e centralizadora. Você se mete em tudo?
Richers - Claro! É o meu negócio! Hoje, estou com 82 anos e por isso passei a vice-presidência da empresa para o meu filho, o Herbert Richers Jr., que desenvolveu experiência neste setor.
VV - Mas você ainda puxa a orelha dele?
Richers - Puxar a orelha é modo de dizer (risos), mas eu fiscalizo sim. Tenho dois filhos aqui na administração da empresa, o Herbert, que é o caçula, e o meu filho mais velho, o Ronaldo Richers.
VV - Faltou você falar sobre sua experiência com distribuidor de vídeo?
Richers - A distribuidora de vídeo surgiu por causa da minha amizade com o Mikael Solomon. Ele era presidente da Lorimar nos EUA. Eu representava e vendia os filmes da Lorimar para a TV, mas eles não tinham distribuição em vídeo no Brasil. O Mikael me ofereceu os produtos e eu topei fazer a experiência. Montamos o esquema de distribuição e nos demos muito bem. A operação só parou por causa de uma negociação lá fora. O Mikael vendeu as ações da Lorimar para a Warner e se tornou o presidente da major. Assim, os filmes da Lorimar passaram para a ser distribuídos no mundo todo pela Warner, inclusive no Brasil.
VV - Mas se você tinha uma estrutura montada, imagino que não teria dificuldades de fazer acordos comerciais lá fora. Afinal, você era conhecido...
Richers - É verdade. Mas já tinha muita coisa para administrar aqui, para ter que sair ao mercado internacional para comprar filmes. Teria que abandonar o meu trabalho.
VV - A televisão continua sendo seu maior cliente de dublagem. Mas será que o DVD não vai será rival da TV no mercado de dublagem?
Richers - Tenho certeza que isso acontecerá a curto prazo. Mas como disse, ainda há preconceito com uma boa dublagem. Há distribuidoras que preferem lançar o filme apenas legendado. Mas quem compra o DVD, sabe que esta mídia oferece muitos recursos. Oferece a legenda e o conforto da dublagem. Há uma quantidade grande que não lê com facilidade a legenda. A Warner, a Sony e a Buena Vista, que são os grandes, já perceberam isso, tanto que todos eles são meus clientes. E faço a dublagem em 5.1 coisa que os concorrentes ainda não dominam.
VV - Para finalizar, destes filmes que você vai lançar pela Europa, qual é o do seu coração?Richers - O filme que mais me orgulho de ter produzido é Meu Pé de Laranja Lima. A forma como me envolvi neste projeto foi muito intuitiva. Comprei o livro no aeroporto depois de ler uma resenha no jornal e estava viajando para São Paulo. É um livro curto, bem escrito, que devorei durante a viagem. Mal cheguei em São Paulo, fui com pressa à Editora Melhoramentos para comprar os direitos. Quando cheguei na editora, o autor, José Mauro de Vasconcelos, estava lá e ficou muito empolgado com a possibilidade de ver sua obra nas telas. No dia seguinte, estava armando a produção para rodar o filme em Vassouras (RJ). Uma curiosidade foi que sempre buscava associação com empresários para produzir uma parcela de meus filmes, mas neste ninguém acreditou. Banquei o filme integralmente e foi o maior sucesso da minha carreira. Custou US$ 150 mil e em um mês já estava pago. Depois de um ano, a receita dele para a empresa já tinha passado de US$ 1 milhão. Depois, vendi para a Europa por US$ 200 mil e para a América Latina por US$ 150 mil. E não foi só sucesso comercial, Meu Pé de Laranja Lima ganhou também o Prêmio Astúrias. Enfim, depois dele adaptei outras histórias do José Mauro de Vasconcelos, como As Confissões do Frei Abóbora e Rua Descalça, que não fizeram o mesmo sucesso, porque não tinham a química toda especial que Meu Pé de laranja Lima tinha.
VV - O filme já foi restaurado?
Richers - Já e acho que será lançado pela Europa em DVD.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Essa Continental....

Eles lançam e ninguém sabe, pelo menos eu não sabia... E eu ainda compro a Set todo mês pra ver os lançamentos de dvd em terras brasilis:
Pra saberem o que mais ela lançou: http://www.dvdcontinental.com.br/ e ainda www.sodublados.com.br
Essa dica enviado por Ernesto Barros.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

SOUNDTRACKS'


John Williams - The Fury

Simon Boswell - Ghosthouse

Stelvio Cipriani - Tentacoli
http://lix.in/c8551e


Stelvio Cipriani - Incubo sulla città contaminata
http://lix.in/df3d3c